“Sempre sobra muita coisa na padaria e para não botar fora a comida e ir direto para as pessoas, pensei que tinha que fazer alguma coisa”. A frase é da empresária Silvia Cadore Martello, da padaria Vó Pina, no centro de Passo Fundo.
Há 18 anos com o estabelecimento, Silvia vê diariamente pessoas carentes irem até a padaria pedir comida. Para suprir essa necessidade e ao mesmo tempo fazer uma boa ação, Silvia pensou em diversos meios, que até então não tinham se concretizado.
A ideia inicial para ajudar era criar uma ‘geladeira solidária’, mas por ter a padaria junto a um prédio residencial, acreditou que a vizinhança poderia não gostar. “Eu queria fazer algo que não prejudicasse os moradores, a intenção é sempre ajudar, não atrapalhar”, declara. Com isso em mente, Silvia começou a procurar ideias na internet. “Um dia estava olhando a internet e vi uma padaria de Curitiba que faz esse tipo de doação, mas eles colocam na fechadura na porta. Acho que como sobra ‘pouquinho’ e eles não têm um lugar próprio, fazem dessa forma”, pontua.
Inspirada na padaria paranaense, Silvia colocou a mão na massa e colocou em prática o bem que prega. Mas ela queria um lugar especial para disponibilizar os alimentos, em especial pasteis, pães de queijo e ‘cacetinhos’ e ‘sovadinhos’.
Na frente do estabelecimento, Silvia “arrumou um cantinho”. “Chamei um rapaz para colocar os ganchinhos e penduro as sacolinhas com as comidas. Procuro não colocar em horários que tem muito sol para não estragar. As pessoas passam e pegam e é a coisa mais linda, às vezes até batem no vidro para agradecer”, relata.
Com um mês de duração, Silvia conta que teve que ‘doutrinar’ os clientes, como ela chama. “Eles pegavam tudo o que tinham e eu dizia ‘tem três sacolas, pega só uma’, que daí vem outra pessoa e leva”, lembra.
Nessa quarta-feira (5), por volta das 11h, Silvia colocou três sacolas cheias e elas saíram “rapidinho, é lindo de ver”. Como justificativa para os ‘cabides de alimentos’, Silvia explica que o cliente que vai a padaria é aquele que vai sem carro, a pé. “As pessoas olham, passam e pegam. Antes disso, sempre que eu via alguém mexendo no lixo, eu chamava e dizia que aqui tinha coisa para dar”, conta.
‘Cacetinhos’, ‘sovadinhos’ e pães de queijo vão nas sacolas a serem doadas.
JULGAMENTOS
Quanto aos julgamentos das pessoas sobre a ação de Silvia, a empresária diz que “não adianta só ir à igreja e não fazer o bem”. Ela conta que já a questionaram diversas vezes, de forma particular quando entravam pessoas ‘cheirando mal’. “tinha clientes que chegavam ao caixa diziam ‘para que dar? nós que estamos aqui comprando e fica esse cheiro”, e eu sempre respondia que sempre sobrava e sobra muita coisa e é para fazer o bem, ajudar quem passa”, salienta.
Sem se importar em como a pessoa está vestida, o que faz, ou como se porta, Silvia relembra que ninguém que foi até a padaria pedir comida saiu ‘de barriga vazia”. “Só se estava muito bêbado ou se ‘me’ pegou em um dia muito estressada, mas um copo de leite quente nunca neguei. Criei para isso, estou procurando fazer o bem para as pessoas”.
“SE A PESSOA NÃO PRECISA E PEGA, FICA NA CONSCIÊNCIA DELA”
Há quem passe pela Avenida Brasil Oeste e mesmo sem precisar pega os alimentos. “Se a pessoa não precisa e pega, acho que fica na consciência dela. A minha parte eu estou fazendo”, resume a empresária, que acredita que o bom senso deve prevalecer.
INSPIRAR OUTRAS AÇÕES
Como se fosse uma corrente, as boas atitudes tomam forma e se espalham. Nos 30 dias que o ‘cabide’ está a disposição, Silvia já viu que alguns clientes compram os alimentos e colocam para agregar na rede de solidariedade. “Tem clientes que compram bolos, pasteis e elogiam a ação, dizem que vão sempre contribuir. Foi criado para isso, para ajudar e está dando certo”. Nos seis ganchos, mais do que alimentos, Silvia quer dar um conforto a quem mais precisa.
Diário da Manhã