Polêmica
Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

“Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel”, sem o uso de violência ou ameaça, é caracterizado como crime de furto pelo Código Penal brasileiro. A pena prevista é reclusão de um a quatro anos e pagamento de multa. Segundo as estatísticas, trata-se de um dos crimes mais cometidos no país. Só para se ter ideia, apenas no estado de São Paulo, foram registrados quase 500 mil casos de furtos em 2021. Mas, se depender de um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados, ao menos uma parte desses registros simplesmente vão deixar de existir, pois não serão mais considerados crimes.

A proposta, Projeto de Lei 4540/21, de autoria de um grupo de deputados do PSOL e do PT, propõe mudar o Código Penal brasileiro para incluir duas categorias de furto. A primeira delas seria o chamado “furto por necessidade”, definido no projeto quando uma pessoa, em situação de extrema pobreza, subtrai (furta) para saciar a fome ou necessidade básica sua ou da família. Já a segunda categoria seria o de “furto insignificante”, onde o objeto furtado é de pequeno valor e oferece “insignificante lesão ao patrimônio do ofendido”.

A partir dessas duas categorias, o projeto de lei determina que “não há crime quando o agente, ainda que reincidente, pratica o fato nas situações caracterizadas como furto por necessidade e furto insignificante, sem prejuízo da responsabilização civil”. Na prática, isso significaria que se alguém furtar alimentos para consumo, por exemplo, não ficará mais sujeito às penas previstas para o crime de furto, mesmo que repita o ato várias vezes. Nos casos em que o furto for de pequeno valor, mas não for motivado por necessidade, em vez da pena de reclusão, deverá ser aplicada “uma pena restritiva de direitos, ou aplicar somente a pena de multa”.

“Além de desnecessário, uma vez que a jurisprudência brasileira já aplica o princípio de insignificância nos casos de furtos, o projeto é vago e está orientado por premissas falhas”, avalia Maurício Souza, especialista em Direito Penal. Ele ressalta que a proposta não especifica, por exemplo, como delimitar a insignificância. “Do jeito que está, o texto dá a entender que a avaliação seria feita em comparação com o patrimônio da vítima. Assim, um furto [no valor] de mil reais de um grande supermercado que fatura milhões poderia ser insignificante. Já o de um doce de um vendedor de rua, não. Claro que estou exagerando, mas as leis precisam ser claras o suficiente para evitar interpretações equivocadas”, explica.

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Gazeta do Povo