Justiça
Foto: Reprodução

Por maioria, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve decisão do ministro André Mendonça que havia rejeitado o pedido de interrupção da gestação a uma gaúcha grávida de gêmeos siameses. A decisão se deu, na sessão virtual extraordinária finalizada em 11 de outubro, no julgamento de agravo regimental no Habeas Corpus (HC) 220431. O colegiado entendeu que o caso ainda não foi esgotado nas instâncias anteriores, o que veda a atuação do STF.

Na ação, a Defensoria Pública do Rio Grande do Sul sustentava que, de acordo com relatório médico, os fetos não têm potencial de vida fora do útero, e citava danos à saúde física e psíquica da mulher causados pela gestação. Pedia, ainda, que ela não fosse criminalizada caso o aborto fosse realizado por motivos médicos.

O pedido foi negado pela primeira instância, e habeas corpus foram sucessivamente rejeitados, em decisões individuais, pelo Tribunal de Justiça gaúcho (TJ-RS) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em seu voto pela negativa do agravo, o ministro André Mendonça reforçou que não houve pronunciamento colegiado do STJ, que, na decisão monocrática, também não analisou a matéria de fundo, pois a controvérsia ainda não tinha sido examinada pelo colegiado do TJ-RS. Assim, caso o Supremo atuasse no caso, haveria supressão de instâncias.

Assim, de acordo com o ministro, não compete ao Supremo examinar a questão de direito versada na ação. O caso, segundo ele, é de habeas corpus substitutivo de agravo regimental, cabível na instância inferior.

Criminalização

O relator também não verificou coação ilegal que autorize a atuação do STF no caso. Ele observou que, havendo perigo de morte para a gestante, a decisão que baliza a interrupção da gestação é a adotada pelos médicos, únicos capazes de avaliar a situação. Nessa hipótese, não há necessidade nem mesmo de autorização judicial ou do consentimento da gestante.

André Mendonça lembra que, de acordo com a própria defesa da gestante, o caso não envolve risco imediato de morte à mulher, nos termos da excludente do artigo 128, inciso I, do Código Penal. A pretensão é afastar a criminalização em potencial de uma conduta medicamente recomendada, e não há suporte legal para isso. 

— ​Não cabe ao Poder Judiciário ser previamente consultado sobre a probabilística configuração de um crime — afirmou Mendonça.

Ainda para o relator, não se pode concluir que o caso se assemelha à possibilidade de aborto de fetos com anencefalia, autorizado pelo STF na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54. A seu ver, não se pode deslocar, para um habeas corpus, a profundidade e a complexidade dos debates que o Tribunal realizou ao julgar aquela ação de controle concentrado de constitucionalidade para estendê-la a outras situações particulares de possível inviabilidade de vida extrauterina. O entendimento foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Nunes Marques. Os dois primeiros votaram, também, para determinar que o STJ julgue o agravo regimental lá interposto na primeira sessão subsequente ao seu regular processamento.

Divergência

Único a divergir, o ministro Edson Fachin considerou que, no caso, a interrupção terapêutica da gestação é necessária para resguardar a vida e a dignidade da mulher. A seu ver, o alcance do julgamento da ADPF 54 não se limita a uma ou outra moléstia, mas à inviabilidade da vida fora do útero e às consequências desse fato para a gestante. Para ele, não cabe ao STF criar uma lista de todas as doenças, situações limítrofes e riscos à saúde de fetos e grávidas, pois a Corte estabeleceu definição constitucional referente à laicidade, à dignidade humana, à autodeterminação e à saúde das mulheres.

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Gaúcha ZH