A FAO e outras quatro agências da ONU (FIDA, PMA, OMS e UNICEF) lançaram os mais novos dados globais sobre a fome e outras formas de malnutrição, por meio da edição 2019 do relatório anual o Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo (Sofi, no acrônimo em inglês).
Sofi 2019 apresenta uma inovação na forma de medir a malnutrição global. O relatório introduz um segundo indicador, chamado Fies (“Food Insecurity Experience Scale”), que contribui para monitorar não apenas a fome, mas também outras formas de malnutrição. O Fies é utilizado no Brasil, pelo IBGE, desde 2004, por meio das Pnads.
Diferentemente do tradicional indicador Prevalência da Subnutrição (PoU, na sigla em inglês), que mede a porcentagem e número de pessoas que sofrem fome, o Fies fornece informações sobre o número de pessoas que enfrentam incertezas sobre sua capacidade de obter alimentos nutritivos e suficientes ao longo do ano. Isso inclui não apenas as pessoas em estado de segurança alimentar severa (fome), mas também aquelas em estado de insegurança alimentar moderada.
Nesse sentido, enquanto o PoU indica que cerca de 820 milhões de pessoas sofreram de fome no mundo em 2018; o Fies aponta que cerca de 2 bilhões de pessoas enfrentaram insegurança alimentar moderada ou severa, um valor quase 2,5 vezes maior. Isso tem impacto direto no aumento de outras formas de malnutrição, como a deficiência de micronutrientes e também a obesidade.
Há fatores que explicam a relação direta entre insegurança alimentar e obesidade. Por exemplo: quando as pessoas têm menos recursos para obter alimentos, elas optam pelos mais econômicos e acessíveis.
O problema é que tais alimentos ultra-processados (embutidos, preparações instantâneas, biscoitos recheados, salgadinhos “de pacote”, refrigerantes, etc..) passaram por técnicas e processamentos com alta quantidade de sal, açúcar, gorduras, realçadores de sabor e texturizantes. Não possuem qualquer benefício nutricional. Ao contrário, os alimentos ultra-processados são uma das principais causas dos altos índices de obesidade que estamos observando em todo o mundo.
As últimas estimativas da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) indicam que o número de pessoas obesas no mundo (em torno de 830 milhões) já superou o número de pessoas que sofrem de fome. Hoje, portanto, há mais obesos do que famintos no mundo.
23% da população brasileira estava obesa em 2016. Não haverá vencedores nessa batalha contra obesidade sem a forte participação da indústria de alimentos. A luta contra a obesidade é – e tem de ser – um tema de saúde pública, mas também de cidadania.
Essa já era a realidade na América do Norte, Europa e Oceania há tempos; e mais recentemente na América Latina e Caribe. Mas mesmo na Ásia e na África, a obesidade logo se tornará um problema maior que a fome, dado que em todos os continentes a taxa de crescimento da obesidade é muito maior do que a taxa de crescimento da fome.
Há, portanto, uma pandemia crescente de obesidade no mundo com impactos socioeconômicos altíssimos. Dados mais recentes mostram que a obesidade está contribuindo para quatro milhões de mortes todos os anos, com um custo anual estimado em US$ 2 trilhões, similar ao custo do tabagismo ainda hoje no mundo.
A situação no Brasil é também preocupante. Segundo a Organização Mundial da Saúde, 23% da população brasileira estava obesa em 2016, um valor que chega a 57% da população se for considerado o índice de massa corporal (IMC) maior que 25, o que caracteriza sobrepeso.
É fundamental que o combate à obesidade e outras formas de malnutrição seja mantido como prioridade no Brasil. Em 2014, o Guia Alimentar para a População Brasileira, de autoria do professor Carlos Monteiro, foi adotado pelo Ministério da Saúde. O Guia tem potencial de contribuir substancialmente para combater a obesidade no País. O documento ressalta a importância de uma alimentação baseada em alimentos in natura/frescos (como frutas e legumes) e minimamente processados (farinha de mandioca e carnes frescas embaladas), encorajando a diminuição do consumo dos alimentos processados (como os enlatados) e o banimento dos ultra-processados (como os refrigerantes).
Ademais, a FAO e o Banco Mundial desenvolveram um conjunto de políticas voltadas à prevenção ou redução dos índices de obesidade. Elas dividem-se em três frentes: A primeira é o aumento da disponibilidade de alimentos saudáveis. Isso pode ser feito: 1- regulando os níveis de sal, gordura e açúcar em produtos alimentícios; 2 – proibindo ou restringindo o consume de bebidas com alto teor de açúcar nas escolas; e 3 – promovendo acessibilidade aos mercados de alimentos frescos.
O Sul