Economia
Foto: Agencia RBS

Em janeiro, a cada litro de gasolina injetado no tanque, o consumidor gaúcho pagou, em média, R$ 1,43 de ICMS. Desde a semana passada, o peso do tributo estadual sobre o combustível está no centro de um debate desencadeado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro.

Cobrado pela alta nos postos, Bolsonaro disse que o problema está no recolhimento de ICMS, embora os impostos federais representem cerca de 15% do preço final da gasolina. O episódio provocou a reação de governadores, entre eles Eduardo Leite.

— O mais recomendável seria uma reunião, e não tratativas por redes sociais ou por declarações à imprensa — disse o governador do Rio Grande do Sul em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 5 deste mês.

Até janeiro de 2014, o consumidor gaúcho pagava R$ 0,74 de ICMS por litro de gasolina. Hoje, desembolsa R$ 0,69 a mais, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Descontada a inflação, a alta é de 44%. O salto, segundo o engenheiro químico João Luiz Zuñeda, sócio fundador da MaxiQuim, se deve a um conjunto de fatores, começando pela alíquota de ICMS. Em 2016, o percentual passou de 25% para 30% no Estado. A majoração tem validade prevista até o fim deste ano.

Outro fator a ser levado em consideração é a política de preços da Petrobras. Até 2016, no governo Dilma Rousseff, a estatal absorvia os reajustes praticados no mercado internacional. A partir da gestão de Michel Temer, isso mudou, elevando os preços do combustível no país.

Há ainda um terceiro aspecto a ser contabilizado: a repercussão do álcool na conta, que representa 27% da gasolina comum e aditivada. Como o Estado não produz o componente, a maior parte vem do Paraná e de São Paulo, ampliando a fatura.

— Tudo isso se soma para o preço alto. E o mais curioso é que o Rio Grande do Sul é um Estado que produz gasolina mais do que consome. Ainda assim, tem uma das gasolinas mais caras do país — ressalta Zuñeda.

Presidente do sindicato dos postos de combustíveis do Estado (Sulpetro), João Carlos Dal’Aqua tem repetido que o problema “não é o posto, é o imposto”. Ele defende alterações na maneira como é definido o valor da gasolina no Rio Grande do Sul.

Hoje, a alíquota de ICMS incide sobre o preço de pauta (média do que é praticado nas bombas), calculado pela Secretaria Estadual da Fazenda a cada 15 dias, a partir de pesquisa junto aos postos de combustíveis com base em notas fiscais eletrônicas.

Na avaliação de Dal’Aqua, Bolsonaro “agiu certo ao questionar a forma de cobrança e ao sugerir que o ICMS tenha valor fixo por litro”. O tema veio à tona no Twitter e se transformou em polêmica.

Ciente dos esforços de Leite para rever a matriz tributária – um projeto de lei deve ser apresentado ainda neste semestre à Assembleia Legislativa –, o presidente da Sulpetro considera positiva a posição do governador de não renovar a majoração do ICMS. Dal’Aqua defende a redução do ICMS, mas diz que isso dificilmente resolverá o problema.

— A questão é: vai baixar para quanto? Para 25%? É claro que isso nos dará algum fôlego e, com a concorrência que temos, vai se refletir nas bombas, mas a alíquota seguirá alta — pondera.

Em Santa Catarina, onde a alíquota de ICMS é de 25%, a diferença média para o preço cobrado nos postos é de R$ 0,40. Em tese, estima Dal’Aqua, a redução poderá ficar próxima disso, caso Leite decida adotar o mesmo percentual.

Chefe da Receita Estadual, Ricardo Neves Pereira diz que o governo do Estado está estudando a revisão das alíquotas e da carga tributária nos diferentes setores da economia.

— O setor de combustíveis, em especial, está passando por profundas transformações, inclusive com proposta de cobrança monofásica (de uma só vez) diretamente nas refinarias, como propõe o governo federal, o que pode ser bem importante para redução de fraudes, manutenção da arrecadação e garantia de competitividade entre as distribuidoras e os postos. A Receita Estadual é favorável à mudança que traga mais segurança jurídica e torne o imposto definitivo na refinaria — afirma Pereira.

Composição do preço

Confira do que é composto o preço da gasolina no Brasil, em percentuais médios, a partir de cálculos em 13 capitais e nas regiões metropolitanas.

13%: distribuidores e revendedores

Percentual que vai para as empresas responsáveis por tirar a gasolina das refinarias e levá-la até as bombas. Essa fatia deve ser usada para cobrir os custos de transportes e de pessoal, entre outros, oferecendo margem de lucro para distribuidoras e donos de postos.

14%: usinas e produtores de etanol

O consumidor compra a gasolina C, que é a mistura de gasolina A com etanol anidro. As distribuidoras compram etanol das usinas produtoras. A proporção da mistura, determinada pelo Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool, é de 27% para gasolina comum e aditivada. No caso do RS, o Estado não produz álcool. A maior parte do componente vem do Paraná e de São Paulo, o que eleva os custos.

29%: Estados (ICMS)

Percentual correspondente ao ICMS. O tributo é uma das principais fontes de receita dos Estados. Desde 2016, no RS, a alíquota do ICMS da gasolina subiu de 25% para 30%, o que explica, em parte, porque aqui o produto é mais caro.

15%: governo federal (Cide e PIS/Pasep e Cofins)

Parcela que engloba impostos federais, que têm o mesmo peso em todos os Estados. Os valores arrecadados vão para o caixa do governo e podem ser usados para diferentes fins na máquina pública.

29%: Petrobras

É a fatia que, de fato, fica com a estatal.

Impacto na arrecadação do Estado

Em média, 18% da arrecadação de ICMS do Estado vem dos combustíveis.

Isso representa cerca de R$ 6,5 bilhões por ano.

O Estado fica com 75% (R$ 4,9 bilhões) desse valor e os municípios, com 25% (R$ 1,6 bilhão).

No caso do Estado, R$ 4,9 bilhões se equivalem a três folhas de pagamento brutas do Executivo.

A polêmica de Bolsonaro

Cobrado pela população sobre a alta dos combustíveis, o presidente Jair Bolsonaro vem repetindo que o problema está na cobrança do ICMS — embora os impostos federais representem cerca de 15% do preço final da gasolina. O episódio levou a reações dos governadores, que se manifestaram publicamente em tom crítico à fala de Bolsonaro.

— Se Bolsonaro convidar governadores para diálogo franco, aberto, tecnicamente robusto, os governadores, provavelmente, aceitarão. Mas a imposição aos governadores de que cabe a eles a responsabilidade da redução do ICMS e, consequentemente, do combustível, é atitude populista e, ao meu ver, pouco responsável — declarou o governador de São Paulo, João Doria (PSDB).

No Rio Grande do Sul, Eduardo Leite garantiu que os governadores “têm interesse e disposição em buscar solução para o tema”, mas que isso precisa ser tratado com respeito:

— O mais recomendável seria uma reunião, e não tratativas por redes sociais ou por declarações à imprensa.

Gaúcha ZH