Embora os gráficos da pandemia da covid-19 no Rio Grande do Sul estejam, felizmente, descendentes, a confirmação de que já há transmissão comunitária da variante Delta do coronavírus em terras gaúchas indica desafios no horizonte. São casos em que a transmissão ocorre entre pessoas de um mesmo território, sem histórico de viagem ou sem a possibilidade de definir a origem da infecção.
A mutação originada na Índia tem maior potencial de contágio entre as que enfrentamos até aqui. Conforme comunicado do Centro Estadual de Vigilância em Saúde, divulgado no sábado (24), há três casos confirmados da Delta no Estado: dois em Gramado e um em Nova Bassano (este, contraído no Rio de Janeiro). No entanto, outros 11 estão em análise, e são de municípios de diferentes regiões: Alvorada, Canoas, Esteio, Gramado, Passo Fundo, São José dos Ausentes, Sapucaia do Sul e Santana do Livramento.
– Diante desse cenário, acho que o principal desafio será conseguir conscientizar as pessoas de que a normalidade ainda não pode existir. Embora tenha havido uma redução grande de casos graças à vacinação desde abril, ainda se tem pouco conhecimento do impacto da variante em uma população que está apenas parcialmente imunizada – aponta Fabiano Ramos, coordenador do serviço de infectologia do Hospital São Lucas da PUCRS.
Ramos recomenda ainda cautela em relação à circulação. Viajar e frequentar espaços fechados ou mal ventilados já eram comportamentos de risco, e eles tendem a aumentar na convivência com uma mutação mais transmissível.
Além da conscientização de que medidas preventivas como o uso de máscara e distanciamento ainda são necessárias em meio à ansiedade por voltar ao normal, especialistas avaliam que o Estado precisa de um foco maior na imunização completa: ou seja, assegurar que as duas doses sejam aplicadas e, preferencialmente, no menor intervalo recomendável.
O principal desafio será conseguir conscientizar as pessoas de que a normalidade ainda não pode existir.
FABIANO RAMOS
infectologista
– A campanha de vacinação ainda é precária. Acho que é preciso divulgar mais agressivamente a informação de que, sem a segunda dose, a pessoa não está segura para uma confraternização sem máscara. Além disso, temos ferramentas como o WhatsApp para fazer um chamamento de quem não tomou a segunda dose. Isso será fundamental – avalia Luciano Goldani, infectologista do Hospital de Clínicas e professor da UFRGS.
Outro ponto em que há escassez de informação, conforme Goldani, diz respeito à interação entre vacinados e não vacinados, mais arriscada para o segundo grupo do que parece. São casos de pessoas que não foram imunizadas, mas se sentem seguras de conviver livres de cuidados com parentes de mais idade, por exemplo, porque eles estão.
Sem a segunda dose, a pessoa não está segura para uma confraternização sem máscara.
LUCIANO GOLDANI
Infectologista
– Isso é um engano, porque a vacina não previne totalmente a infecção. Uma pessoa vacinada pode se infectar, não adoecer em razão da vacina, mas ainda assim excretar o vírus e multiplica-lo. Especialmente essa variante (Delta), que tem como característica a transmissibilidade – explica o infectologista.
Em meio às preocupações, Ramos aponta um fator de otimismo no brasileiro:
– Assistimos as notícias de outros países que mostram o crescimento da Delta, sobretudo em populações resistentes à vacina. Uma característica cultural nossa é a adesão maior à vacinação. Então algo que podemos fazer é acelerar o acesso a essa imunização.
GZH