Saúde
Foto: Reprodução

Wuhan, onde a pandemia começou, foi isolada no dia 23 de janeiro. No dia seguinte, a mil quilômetros dali, na cidade de cantão, um homem recém-chegado de Wuhan reunia a família num restaurante. Ele não tinha sintomas, mas estava infectado pelo novo coronavírus.

A vigilância epidemiológica da China, que mapeia todos os movimentos de quem é testado positivo para a Covid-19, percebeu que dez pessoas de três famílias diferentes que almoçaram no restaurante naquele dia foram contaminadas. Mas a maioria não teve contato físico com o homem – chamado de paciente A1. Nem tocou nas mesmas superfícies. Mas, então, como houve o contágio? É possível a transmissão aérea do vírus? Pesquisadores e autoridades chinesas juntaram técnicas de investigação criminal e ciência para resolver esse mistério.

Pelas imagens das câmeras de segurança foi possível descobrir que todos os infectados estavam sentados nas três mesas no fundo do terceiro dos cinco andares do restaurante. Na linha de ventilação de um único ar-condicionado. As mesas com as famílias A — do paciente com a Covid-19 –, B e C ficavam, aproximadamente, a um metro uma da outra.

Os pesquisadores reconstituíram a cena, usando bonecos com a temperatura do corpo humano. E soltaram um gás marcador que se propaga no ar como o coronavírus pra representar a respiração do único infectado, o paciente A1. Eles concluíram que o fluxo do ar-condicionado, no ambiente fechado, infectou as outras pessoas. Quatro da família a, do paciente A1, testaram positivo nas semanas seguintes. Três dos quatro membros da família B. E dois dos sete da família C.

“Nesse corredor de ar, provavelmente, a pessoa contaminada estava emitindo as partículas enquanto falava, em aerossol, e isso estava rodando sobre esse ambiente. Tanto que nenhum garçom se contaminou. E as outras mesas que estavam fora desse corredor onde o ar ficava circulando também não se contaminaram. Então é um estudo bem elegante que mostra um indício muito claro de que pode ter transmissão pelo ar”, explica Natalia Pasternak, professora da USP.

Aerossóis são micropartículas — muito, muito pequenas — de poeira, poluição, que ficam em suspensão no ar. Em um centímetro cúbico de ar, pode haver de dez a vinte mil aerossóis.o vírus é ainda menor. E pode se colar a essas micropartículas –- que se transformam em superfícies de transmissão.

“Então se uma pessoa contaminada passou numa sala que está fechada e contaminou o ambiente com o vírus, você chegando três horas depois, você corre, sim, o risco de pegar”, disse Paulo Artaxo, professor da USP.

Outro estudo foi feito em dois hospitais de Wuhan. Os pesquisadores encontraram partículas do vírus principalmente em banheiros, refeitórios e salas onde os médicos tiram a roupa de proteção. Todos os espaços mal-ventilados.

“Nos ambientes fechados, que têm pouca ventilação, que têm pouca troca de ar com o ambiente externo, são os ambientes onde o vírus se concentra mais em aerossol. É mais cuidado pra gente tomar”, salienta Natália Pasternak.

No Japão, uma série de experiências reforça a possibilidade de infecção pelo ar. Usando raio-laser e câmeras muito sensíveis, os cientistas conseguem acompanhar as micropartículas no ar. Quando alguém espirra, vemos as gotículas maiores logo caindo mas as micropartículas, todas menores do que um centésimo de milímetro, muito leves, ficam pairando no ar.

O mesmo acontece quando duas pessoas, sem máscaras, estão conversando, perto uma da outra. As micro gotículas não se dispersam. Outro laboratório simula um ambiente fechado com dez pessoas. Uma tossida emite cem mil gotículas. As maiores, em azul e verde, caem. Em um minuto estão no chão. Mas as micro gotículas, em vermelho, ficam suspensas no ar. O tempo passa. E elas não se movem.

Mas tem um jeito simples e barato de fazer essas micro gotículas desaparecerem. É só abrir as janelas, ventilar o ambiente. O teste japonês mostra que quando existe uma corrente de ar as micropartículas são rapidamente levadas embora.

G1