O atirador de Novo Hamburgo, que matou três pessoas e feriu outras nove na madrugada desta quarta-feira (23), havia sido internado quatro vezes por esquizofrenia. O transtorno, caracterizado por sintomas psicóticos, afeta cerca de 23 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
O psiquiatra e coordenador do curso de Medicina da Universidade Feevale, Pedro Beria, garante que a maioria dos pacientes com essa condição não costuma ser agressivo.
— Grande parte das vezes que os pacientes esquizofrênicos necessitam de internação é porque eles estão sob algum risco psiquiátrico, como autolesão. A maioria não apresenta comportamentos agressivos em relação a outras pessoas, mas também pode ser uma possível causa de internação. Quando ocorre um episódio de agressividade, pode ser dentro de um quadro sintomático psicótico, em que o paciente está apresentando algum delírio, distorção de pensamento ou alucinação — explica.
Segundo a Opas, a esquizofrenia geralmente começa no fim da adolescência ou no início da vida adulta. Os principais fatores de risco, de acordo com Beria, são o histórico familiar positivo para a condição, possíveis exposições a estresses e traumas emocionais, uso de drogas e contatos ou alterações perinatais – condições de saúde ou fatores ambientais que podem afetar o feto ou o recém-nascido.
As principais teorias sobre o surgimento da esquizofrenia no cérebro apontam para questões envolvendo a disfunção dopaminérgica, ou seja, um mau funcionamento do sistema cerebral que produz, libera e recebe dopamina — neurotransmissor essencial para a experiência de prazer, motivação e recompensa.
O aumento desta condição em determinada região do cérebro está associado com sintomas psicóticos como alucinações, delírios, comportamento desorganizado e agitação, frequentes em esquizofrênicos.
— As alucinações auditivas e visuais acabam sendo mais comuns na esquizofrenia. Além disso, o paciente pode apresentar discurso desorganizado, que é uma fala de difícil compreensão, e comportamentos inadequados. A diminuição da atividade da dopamina em outra região do cérebro está ligada a sintomas afetivos e cognitivos, déficit de autocuidado, isolamento social, diminuição na busca por comportamentos associados com prazer, como hobbies ou exercício físico — afirma o psiquiatra.
Diagnóstico e tratamento
Beria explica que o paciente é diagnosticado com o transtorno quando apresenta sintomas como delírios, alucinações, agitação, discurso e comportamento desorganizado, ou isolamento social e apatia por, pelo menos, seis meses sem que outra causa médica explique o comportamento.
Depois de identificar a condição, o recomendado é começar o acompanhamento médico. O tratamento integral e gratuito é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A medicação é capaz de amenizar os sintomas.
— É um transtorno crônico. Então, o paciente esquizofrênico vai ser acompanhado do ponto de vista médico, psiquiátrico e psicológico ao longo da vida. Assim que é feito o diagnóstico, o paciente deve iniciar tratamento. O tratamento farmacológico consiste, principalmente, no uso de medicações que são chamadas de antipsicóticos — pontua o especialista.
Conforme o psiquiatra, o fluxo de tratamento consiste no uso de uma primeira medicação, seguida por avaliação dos resultados. Caso não sejam positivos, há a possibilidade de adotar outras abordagens. Há remédios que podem ser injetados mensalmente, bimensalmente ou trimestralmente, facilitando a adesão.
A Opas salienta que, com o tratamento adequado e o devido suporte social, esquizofrênicos podem voltar a ter uma vida produtiva e integrada à sociedade.
Acesso a armas
Outro fator de atenção no caso de Novo Hamburgo é que mesmo com o histórico de problemas psiquiátricos, o atirador tinha porte de arma para Colecionador, Atirador e Caçador (CAC), registro no Sistema Nacional de Armas (Sinarm), da Polícia Federal (PF), e no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma), do Exército.
— Devido às características psicóticas do transtorno, não é indicado que os pacientes tenham acesso a armas de fogo — defende Beria.
A PF confirmou que o homem apresentou “laudo psicológico de apto para aquisição de armas, emitido por psicóloga devidamente credenciada”.
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