
Pesquisadores australianos descobriram que uma doença comum, a vaginose bacteriana (VB), pode ser na realidade uma infecção sexualmente transmissível (IST) disseminada dos homens para as mulheres. O estudo em que relatam os achados foi publicado na revista científica New England Journal of Medicine nesta quarta-feira.
A VB é extremamente prevalente, estima-se que afete cerca de 1 a cada 3 mulheres no mundo, e costuma ser caracterizada como um desequilíbrio da microbiota (população de microrganismos) da vagina. Em casos mais graves, pode causar infertilidade, partos prematuros e problemas para recém-nascidos.
O tratamento padrão envolve o uso de antibióticos orais por cerca de uma semana. No entanto, os cientistas da Universidade Monash e do Centro de Saúde Sexual de Melbourne, ambos na Austrália, explicam que cerca de 50% das pacientes desenvolvem novamente a VB dentro de três meses.
Além disso, o comportamento de risco da doença, semelhante ao de diagnósticos como clamídia, e a identificação de bactérias ligadas à VB no pênis são fatores que indicavam que o quadro poderia, na realidade, ser uma IST.
Então, no novo estudo, os pesquisadores decidiram testar uma nova estratégia com casais monogâmicos, ou seja, que não têm relações com outras pessoas. O protocolo envolveu tratar a VB como uma IST, administrando o medicamento simultaneamente para a mulher e seu parceiro.
Os cientistas recrutaram 164 casais em que a mulher estava com VB e os dividiram em dois grupos. No primeiro, composto por 81 casais, ambos receberam o medicamento – as mulheres apenas os antibióticos orais, e os homens os remédios junto a um gel tópico para o pênis.
No segundo grupo, 83 casais seguiram o protocolo padrão, apenas com as mulheres realizando o tratamento. Os voluntários foram acompanhados por um período de 12 semanas para avaliar a recorrência da doença.
Entre os casos em que ambos realizaram o tratamento, 35% das mulheres voltaram a manifestar a vaginose bacteriana após três meses. Já no segundo grupo, que seguiu a estratégia convencional, a taxa foi significativamente maior, de 63%, indicando a eficácia superior ao tratar a VB como uma IST.
“Nosso estudo mostrou que a reinfecção de parceiros está causando grande parte da recorrência da VB que as mulheres experimentam, e fornece evidências de que a VB é de fato uma IST”, resume Catriona Bradshaw, professora da Universidade Monash e autora do estudo, em comunicado.
“Essa intervenção bem-sucedida é relativamente barata e curta e, pela primeira vez, tem o potencial não apenas de melhorar a cura da VB para as mulheres, mas também abre novas e empolgantes oportunidades para a prevenção da VB e das complicações graves associadas à doença”, continua.
A pesquisadora da universidade Lenka Vodstrcil, que também participou do trabalho, explica que já se sabia que um diagnóstico de VB aumentava o risco de contrair outras ISTs, o que acendeu a suspeita de que ela poderia ser também transmitida sexualmente:
“Há muito tempo suspeitamos que se trata de IST porque ela tem um período de incubação (após o sexo) semelhante ao da maioria das ISTs e está associada aos mesmos fatores de risco de ISTs como a clamídia, como mudança de parceiro sexual e não uso de preservativos”.
Bradshaw conta ainda que outros estudos já indicaram que homens podem abrigar espécies bacterianas associadas à vaginose na pele e no interior do pênis. Até então, porém, os trabalhos não haviam observado um benefício maior em tratar a doença como uma IST.
“Isso foi interpretado como evidência contra a transmissão sexual. No entanto, esses estudos tinham limitações de projeto e nenhum deles usou uma combinação de antibióticos orais e tópicos para eliminar adequadamente as bactérias da VB em homens, especialmente do local da pele do pênis”, explica a professora.
Para ela, agora o novo estudo “fornece evidências de que a VB é de fato uma IST”. O próximo desafio é identificar as bactérias exatas responsáveis pela infecção: “Parte da dificuldade em estabelecer se a VB é sexualmente transmissível tem sido o fato de ainda não sabermos exatamente quais bactérias são a causa, mas os avanços no sequenciamento genômico estão nos ajudando a fechar esse mistério”, diz.
No Centro de Saúde Sexual de Melbourne, os resultados já levaram a uma mudança na conduta para tratar a paciente com VB e o seu parceiro simultaneamente. Para alterações mais definitivas nas diretrizes nacionais e internacionais, porém, as pesquisadoras explicam que “sempre leva mais tempo”.
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